Escrevia no papel
Hoje uso o meu celular
Conversava cara a cara
Hoje vivo a zapear
Esse maldito aparelho
Acendeu sinal vermelho
Conseguiu me dominar
Eu estava ontem somando
Todo o tempo que gastei
Somente num simples dia
Eu digo que me assombrei
Pra família quase nada
A leitura acumulada
Nem da saúde cuidei
Contudo o tempo plugado
Muito e muito tem crescido
Com celular, note e streaming
Eu estou bem exaurido
Não consigo nem dormir
A tela a me consumir
Bem viciado e abatido
Eu tenho um milhão de amigos
Nenhum aperto de mão
Seguidores aos milhares
Queria mesmo um abração
Gente só pra conversar
Sentir o calor, pegar
Que não seja do grupão
Não sinta pena de mim!
Olhe só pra sua vida
Não está bem parecida?
Seguindo mesma batida
Com a tecno escravidão
Perversa dominação
Alienante e consentida
Espere só um pouquinho
Vou curti uma fotinha
Chora triste lá na sala
Minha filha de trancinha
Com quem prometi brincar
Filha! Vai ter que esperar
Vou zapear com a vizinha
Não preciso mais pensar
Tem app pra quase tudo:
Lembrar de não esquecer
Como agilizar o estudo
Pra medir minha pressão
Jogos, muita diversão
Então sou mesmo um sortudo?
Tá virando pandemia
Que se alastrou pelo mundo
Afeta muita a saúde
Torna o homem um moribundo
Provoca acidente e morte
Dor no pescoço bem forte
Isolamento profundo
Dizem ser trama macabra
Pra alienar e dominar
A luz da tela enfeitiça
Faz a gente viajar
Pra uma falsa realidade
Do tempo da pós verdade
Se salva quem acordar
Findo aqui esse relato
Muito tempo nos tomou
É apenas desabafo
De quem também não mudou
Mas que pensa sobre o tema
Quem gostava de cinema
Mas que se Netflicou.